sexta-feira, dezembro 26

Jesus também nasceu em terra Pökot

Chamou-me a atenção que as crianças vestiam diferente. Roupas novas, cheios de cor, limpinhas. Dirigia-me da nossa casa da comunidade para a capela. O dia era importante para mim. Verdadeiramente havia algo distinto no ar. Era dia de Natal. Pela primeira vez iria presidir à Eucaristia na capela central da nossa missão de Kacheliba… confesso estar um pouco nervoso. Não domino ainda a língua local, o swahili. E devia presidir à Eucaristia. E logo no dia de Natal com a capela a abarrotar de gente…

No dia anterior, noite de Natal, tinha ido com o meu colega, P. Hubert, celebrar a vigília na comunidade de Kodich, uma das capelas mais antigas da missão. Não fica muito longe. Cerca de 25km do centro de Kacheliba. Porém, a noite já caída na estrada de terra batida, exigia maior cuidado na condução. A sombra da luz do carro ocultava por vezes autênticas crateras na picada. Mas nada do outro mundo. Tínhamos sim de ter cuidado com o casal que levávamos connosco. É da praxe. Todas as vezes que saímos a algum lugar há sempre gente a pedir uma boleia. Desta vez levávamos connosco um casal que regressava à sua aldeia, depois de ter estado todo o dia no centro de saúde de Kacheliba. O costume - a doença mais comum nestas terras: malária com gastroenterites. A primeira devido ao calor que é uma autêntica incubadora para a proliferação dos mosquitos. A segunda devido à falta de água potável. E estamos só no início da época seca. A água que muitas vezes conseguem arranjar é retirada de buracos feitos nos leitos dos rios ou nos charcos que armazenam a água das últimas chuvas caídas já há mais de mês e meio.

Na bagagem levávamos também um elemento indispensável para a noite: um bidão com algum gasóleo para o gerador de energia da capela. Na verdade, não há luz eléctrica por estas bandas. Esta capela, instalada no perímetro da escola primária construída pelos missionários há uns anos, tem um sistema eléctrico instalado que funciona a partir de um pequeno gerador. A noite ia ser longa. É que é da praxe, depois da vigília, todos se reunirem à volta da televisão da escola para ver um filme sobre a vida de Jesus. É a melhor prenda de Natal que todos podem ter, cristãos e não cristãos.

Chegámos à capela e já esperavam por nós. Obviamente, tudo às escuras. Uma pilha eléctrica aqui e ali. À meia-luz pareciam já estar na capela um bom número de pessoas à nossa espera. O que verificámos ser verdade, depois de alguns trabalhos para pôr o gerador a funcionar. Mas lá conseguimos com a ajuda do catequista.

A celebração estava marcada para as 8 da noite. Havia baptismos de 9 crianças, filhos de cristãos baptizados. Pelo menos um dos pais deve ser já baptizado. Porém, eram 8 e meia da noite e apenas uma mãe com o seu filhote para baptizar marcava presença. Tínhamos que esperar, como sempre, à boa maneira africana. Aqui a hora certa é sempre muito relativa: a hora certa é aquela em que se chega, não aquela que se combina!

Um dos problemas com que lidamos neste povo é o facto de os homens Pökot serem muito resistentes a aderir à prática cristã. De facto, o maior número de baptizados em toda a missão Pökot são a mulher e os adolescentes/jovens que tenham recebido formação escolar. Por outro lado, alguns homens acabam por se casar tradicionalmente com mais que uma mulher, facto que os impede de receber o baptismo.

O meu colega, entretanto, aproveitou para confessar alguns cristãos já ali presentes. Ao mesmo tempo, na capela, já se iam afinando os cânticos para a celebração. A capela já estava com muita gente. Alguns cristãos chegados para celebrar o Natal do Deus Menino. Muitos outros chamados pela curiosidade do eco dos cânticos que se ensaiavam.

Quase às 10 da noite estava tudo a postos. Todas as mães ali estavam com os seus filhotes para serem baptizados. À 4ª chamada, por fim, já ali estavam todas. Pais, nem um sequer. Finalmente podíamos iniciar. O calor da noite fazia que o odor dentro da capela a abarrotar de gente fosse intenso. Sobretudo, um odor típico do povo Pökot, todos os dias a lidar com os animais. Não havia dúvida. Aqui respirava-se Pökot!

A celebração foi-se desenrolando sempre, porém, com aquilo a que costumo chamar o ambiente litúrgico africano. Isto é, sem muito preciosismo e atenção aos rituais por parte das pessoas. Muitas delas só participam na Eucaristia duas ou três vezes por ano. Não estão habituados à liturgia com os “pontos nos is”. É tudo bem mais natural e espontâneo. Na verdade, creio mesmo que se alguns liturgistas europeus aqui viessem teriam um ataque do coração, tal é o ambiente de muito à vontade com que as celebrações aqui se desenrolam. A maior parte dos participantes nestas celebrações maiores não são sequer cristãos. Por isso, entram e saem quando muito bem lhes apetece. Ou então o bebé que começa a chorar e a mãezinha dá-lhe de imediato a chupeta africana: o peito a mamar! Sem pejo e com toda a naturalidade.

É chegada a hora do baptismo. Explicamos os ritos, os sinais, os gestos de todo o sacramento. Levámos a água connosco num pequeno bidão de plástico. A bacia é também levada pelo missionário. Não há pia baptismal. A concha para o baptismo, é a melhor e mais natural, aquela que Deus criou: as mãos do sacerdote. Sente-se a alegria no ar, expressa no entusiasmo com que todos na capela cantam o hino de agradecimento ao Senhor por mais estes dons sobre os seus filhos Pökot.

Entretanto a luz apaga-se. O gerador deixou de trabalhar. Tudo às escuras. “Eu vou ver o que se passa, Hubert!” – disse eu ao meu colega que presidia à celebração. Tirei a minha estola e com a pilha que sempre trago “à mão de semear” fui com um dos catequistas presentes ver o que se passava. Alguém, por maroteira tinha desligado o gerador. O combustível que lhe tínhamos posto era impossível ter já terminado. Junto ao gerador, no meio da escuridão apenas quebrada pela ténue luz da pilha eléctrica, deparo-me com um guarda local, de klaschenikov em punho. “É o vigilante, sr. Padre! Não se preocupe!” – tranquilizava-me o catequista. Ele que, logo que se apercebeu que alguém tinha desligado o gerador por maldade, começou a gritar com o vigilante armado pela sua incompetência em não guardar bem o gerador e não deixar ninguém aproximar-se.

Voltámos à capela com o problema resolvido e com a eucaristia a prosseguir. Não houve mais incidentes até ao final da eucaristia. Apenas e só o ambiente do costume… sempre um burburinho aqui e ali, descontracção, muito à vontade e também muita alegria. No momento de acção de graças foram 3 os cânticos que se cantaram… acompanhados pela típica dança Pökot, Adongo. Uma espécie de saltos na vertical ao ritmo do canto. É tal a energia contagiante desta alegria que nem mesmo o padre pode deixar de bater as palmas e saltar com alegria.

A seguir à celebração seguia-se a sessão da meia noite, com o filme sobre o nascimento de Jesus recentemente saído aos ecrãs. Claro, em inglês. É mais uma vez o trabalho do catequista fazer a tradução para as pessoas ali sentadas, agora já no recreio da escola. Num ápice, os bancos da escola que antes tinham sido levados para a capela, aparecem agora no recreio da escola. Dezenas de pessoas ali ficam até bem de madrugada. Afinal, é noite de Natal, noite de alegria, noite diferente.

Ficámos com as pessoas por um tempo, mas era necessário regressar à missão. Aguardava-nos ainda cerca de 45 minutos de viagem pelas picadas Pökot sempre cheias de surpresas ao mais pequeno descuido. Eram já uma e meia da madrugada quando chegámos a Kacheliba.
No dia seguinte de manhã era o tempo de outras emoções. A primeira celebração em terra Pökot em língua swahili presidida por mim. O sonho de muitos anos de formação missionária. O sonho de qualquer missionário: trazer Jesus Eucaristia ao meio deste povo que caminha e é também amado pelo Deus Menino.

Festa que se preze em África não deve nunca começar à hora marcada! Com meia hora de atraso, às 10.30 da manhã, na capela principal da missão, iniciava-se a Eucaristia do dia de Natal. Sentia um nervoso miudinho. Mas tinha-me entregado nas mãos de Deus Pai, Töroröt Papo, como assim lhe chamamos em língua Pökot. E como por milagre, apenas iniciei a Eucaristia com o sinal da cruz, senti que já nada me fazia temer. Era o Deus Menino aquele que agora tomava a dianteira. Era Ele o festejado e o Senhor da Festa. Por isso deixei-me apenas ser instrumento do Seu Amor também por este povo Pökot na missão de Kacheliba. Estava seguro que assim, tudo iria correr bem.

E assim foi! Deus Menino Jesus também nasceu no coração do povo Pökot da missão de Kacheliba, Quénia.

P. Filipe Resende, mccj
Relatos da Missão em Kacheliba
North Pökot – Quénia
Foto: Momento da homilia na capela de Kacheliba – Natal 2008

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quarta-feira, dezembro 24

Noeli Njema! Bom Natal!


Encontro-me na missão de Kacheliba desde há 3 semanas. Esta missão fica situada no noroeste do Quénia, já praticamente na fronteira com o Uganda. Todo o território da missão fica situado num grande vale, numa região semi-desértica, a savana africana. O território da missão é o semelhante a 2/3 do distrito do Porto… e aqui estamos 3 padres missionários e 3 irmãs, uma delas já com 80 anos! Como podeis imaginar trabalho não falta.
O povo que habita esta região do país é o Povo Pökot. Pastores por natureza, habituados a uma vida dura devido ao clima quente e seco que caracteriza esta região durante quase todo o ano. Devido a isto, é um povo que tem que mover-se junto com os seus animais à procura dos melhores pastos. De facto, para um Pökot, o maior sinal de riqueza é possuir muitas cabeças de gado. O gado é o centro das suas vidas. Ficam admirados quando lhes dizemos que as vacas na Europa podem produzir até 15-20 litros de leite por dia. Aqui quando alcançam os 2 litros de leite já é uma bênção.
Desde que cheguei há cerca de 3 semanas, o meu trabalho tem sido ambientar-me e entrar nas dinâmicas da missão. Pude conhecer os catequistas que colaboram com a missão, uma vez que tiveram o seu encontro de formação apenas uns dias depois de aqui chegar. As pequenas comunidades/capelas da paróquia são cerca de 45, cada uma, geralmente, com um catequista responsável. Sem eles seria impossível levar para a frente o trabalho missionário. Estive também no encontro anual de jovens de toda a paróquia. Eram cerca de 100. Aliás, 75% da população Pökot tem menos de 30 anos de idade. Muita juventude e muita esperança de vida no futuro.
Foi ainda organizado mais um encontro do curso para os catecúmenos, aqueles e aquelas que durante cerca de 2 anos fazem a sua preparação para receber o Baptismo. Os que estão já na fase final de preparação são cerca de 160 em toda a paróquia. Irão receber o baptismo na próxima Páscoa.
Durante este tempo pude também visitar já algumas das capelas e comunidades. Ontem mesmo fui com o meu colega P. Hubert, alemão, celebrar no sopé das montanhas que são o limite da paróquia. Nesta comunidade pediam-nos para podermos passar e celebrar a Eucaristia mais vezes. É que normalmente só podemos celebrar a Eucaristia em cada capela duas ou três vezes por ano.
Durante este tempo fui observando as dinâmicas da missão e aquilo que me espera depois de regressar em Maio do curso da língua swahili (língua oficial do país), que iniciarei na Tanzânia, país vizinho do Quénia, agora no começo de Janeiro. Regressando, terei ainda que estudar a língua local Pökot, mais difícil ainda, mas sem a qual é muito difícil chegar até às pessoas.
Se Deus quiser, este Natal presidirei à minha primeira missa em língua swahili (que já começo a falar!). Na noite de Natal irei a uma comunidade junto com o catequista que depois fará a tradução para a língua local. Será um momento importante da minha vida missionária: presidir à eucaristia, pela primeira vez, na missão que Deus me confiou. Será como a minha “missa nova” na missão.
A seguir publico um pequeno texto sobre o Natal nestas paragens africanas que escrevi como reflexão e mensagem de Natal para enviar aos amigos.

Um menino nasceu para nós… e depois?

Há dias os Pökot do norte do distrito fizeram uma razia junto dos seus vizinhos, os Turkana. Foi em Amakuriat, a outra missão Pökot desta nossa zona missionária, 120km a norte. Há tempos de paz e tempos de roubo de animais e, por vezes, matança de pessoas. Tradicionalmente, só os guerreiros eram vítimas deste tipo de roubos de animais. Ultimamente até crianças e mulheres são mortos.
Em consequência, são várias as pessoas, sobretudo mulheres e crianças, que têm dormido no espaço da missão. Têm medo da vingança do povo vizinho. Alguns jovens Turkana já foram vistos na vizinhança. E não viram com boas intenções… querem vingar a morte das suas mulheres e crianças.

Hoje, domingo antes do dia de Natal, fui com o meu colega, o P. Hubert, celebrar a duas pequenas capelas. São comunidades que têm a celebração da eucaristia apenas duas ou três vezes por ano. São comunidades pequenas. Umas vinte pessoas em cada capela. Entre elas a maioria são mulheres e crianças. Mulheres com mais que uma criança. Uma ao colo e outra pela mão. Numa das capelas, uma das mães amamentava o seu bebé recém-nascido. Perguntei quando tinha nascido. “Há três dias, Padre Filipe!” Respondi: “E apenas com três dias já vieste hoje à celebração?” Eu sabia que teriam de ter caminhado pelo menos cerca de uma hora para chegar à capela. “Não vamos poder celebrar o nascimento de Jesus aqui na capela com a eucaristia. Assim que hoje é como se fosse para nós celebrar o Natal na Igreja” – respondeu-me. E com que alegria o celebraram… entre cantos alegres e sempre com os bebés ao colo. Ao primeiro sinal de choro há que pôr o bebé a mamar. Remédio santo!

Estas duas realidades na missão são o maior desafio que vivemos junto com este povo Pökot. Por um lado as tradições e a vida de todos os dias, onde a vida e a morte são apenas duas personagens da vida de todos os dias que vão de mão em mão. Por outro lado a fé nascente e crescente deste povo que apenas há bem pouco tempo começou a conhecer algo sobre Jesus. A esperança da celebração da vida no nascimento de crianças, a grande fatia da população Pökot, é aquilo que anima os poucos baptizados nesta terra árida e quente do distrito norte Pökot. É a esperança de que este Menino que nasceu para nós, encha de amor e de vida, vida em plenitude (Jo. 10,10), o coração de todos os que olham para a vida com alegria… os que olham para a vida com a esperança da Vida. Não a vida que apenas acaba com a morte, mas a Vida que começa e acaba com o Amor. É esse Amor aquilo que este Menino quer trazer a todos os corações. Aqui em Pökot e também ao meu e teu coração.
Um Menino nasceu para nós… e depois? Que tenho eu a ver com isso? Que tem Ele a ver comigo?

Um feliz e santo natal para todos vós. Que o Menino Deus de Amor, feito Homem para nós, possa encher o teu e o meu coração com as maiores bênçãos: Vida, Esperança, Alegria e acima de tudo Amor.

Relatos da Missão em Kacheliba
North Pokot - Quénia

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segunda-feira, dezembro 15

Casar na missão entre os Pökot

Costumamos dizer que em África não há horas. Há momentos. Momentos para ser vividos na sua plenitude e com todo o significado. Hoje, no casamento de um dos nossos catequistas, pude comprovar isto mesmo mais uma vez.

O meu colega, P. António Dolzan – há 30 anos nesta paróquia! – marcou a hora de saída: 9.00h da manhã. “Mas olha que - dizia-me - demoramos a chegar a Chepkemei cerca de 1 hora. Porém, a missa do casamento só deve começar por volta do meio-dia! Estamos em África!!!”
Tinha razão. Saímos há hora marcada. Um céu limpo com um sol risonho. Bom sinal. Não chove. É que no caminho para esta capela tínhamos que passar por 4 rios sazonais. Não chovendo hakuna matata (não há problema). No tempo das chuvas é impossível chegar a estas capelas, afirmava o meu colega missionário há medida que pulávamos a cada buraco na estrada… perdão: na picada!
Pelo caminho fomos parando aqui e ali para dar boleia àqueles que se dirigiam até Chepkemei para a grande festa.
Chepkemei é uma das capelas da nossa missão que fica já em cima da fronteira com o Uganda. Não! Não pensem que há fronteiras como as que conhecemos em Portugal. Aqui é tudo mato. A um dado momento já nem se sabe bem de que lado estamos. “A divisão entre os dois países são estes montes que vemos ao nosso lado. Mais ou menos é por aqui a fronteira!” – prosseguia o meu colega, o P. Dolzan.
O catequista desta capela é um jovem já casado segundo a tradição Pokot. Provou já ser capaz de ser homem e de consumar o casamento. Dois filhos são a prova disso. Um dos quais vem ainda às costas da Christine, esposa do nosso catequista – Abraham. Estranho, direis. Então um catequista de uma capela já com filhos e ainda não casado pela Igreja?!?! É verdade. Aqui a vida da Igreja pinta-se com outras cores. Tem outras matizes que confundem as mentes cristãs demasiado habituadas à institucionalização da vida sacramental da Igreja nos países de longa tradição cristã. Hoje não há baptismos, uma vez que o casal é já baptizado desde há uns anos.
Por volta das 10 da manhã chegávamos ao local. Uma pequena capela, aliás como todas na paróquia. “Mas P. António! Vocês vêm bem cedo! Ainda estamos a começar a organizar tudo Padre!” dizia-nos um outro catequista convidado de uma capela próxima. “Não há problema – reafirmou o meu colega – nós esperamos o tempo que for necessário! Viemos cedo para poder celebrar também o sacramento da reconciliação com os noivos e os padrinhos. Também para aqueles que o desejarem.” De facto, tínhamos chegado bem cedo. A celebração da eucaristia apenas começaria por volta da 1.30 da tarde!
Os primeiros convidados começam a chegar. Pouco a pouco, foi decidido que a celebração seria não dentro da capela, mas cá fora, à sombra. Debaixo das árvores. Certamente haveria muita gente, mais do que os poucos cristãos existentes nesta capela. A capela seria demasiado pequena para todos. É que um casamento de alguém, é uma celebração social para toda a região. Entre muitos convidados, a maioria não são cristãos católicos. Até mesmo o pastor da Igreja protestante mais próxima marca presença. Mas a grande figura do dia seria o ex-deputado deste concelho, o Sr. Moroto. Convidado de honra…
Entretanto, fui passeando pelo local. Nesta localidade existe uma escola primária construída pela missão. Apenas 4 classes, com 4 salas de aula. Ou seja, aqui nesta escola os alunos podem frequentar metade dos anos da escola primária. Ainda que, segundo o actual governo do país, todos as crianças deveriam ter acesso à educação primária de forma gratuita. A logística da escola (arranjar professores, alimentação, pessoal para manter a escola em funcionamento) é da responsabilidade do Governo. Porém, muitas vezes, é a missão a ter que cuidar também destes particulares.
A um certo momento, vi a cozinha improvisada para a festa. Rodeada de ramos espinhosos (para que as vacas e as cabras não entrem – em terra pokot estes animais têm livre trânsito) lá estavam dezenas de canecas de chapa preparadas para o chá. Vi também a pele de uma cabra pendurada. Foi morta para a festa. Dia de festa quer também dizer dia de comida melhorada com direito a uns pedacinhos de carne. O ugali (farinha de milho cozida) e os três panelões de arroz cozido já estavam prontos, mesmo que o dito almoço, ou melhor dito, a boda, não começasse antes das 5 da tarde.
O tempo corria ao ritmo africano. Era já 1 e meia da tarde e deveríamos começar a eucaristia. Já estava presente um bom número de pessoas, na sua maioria pouco mais de 20 cristãos desta capela. Mas faltava ainda o convidado de honra. Faltavam ainda os familiares dos “noivos-casados” que não chegavam. Pediram-nos para esperar um pouco. Logo de seguida chega-nos a notícia que a camiãozito de caixa aberta fretado para os familiares dos noivos tinha ficado atascada ao passar nas areias de um dos rios sazonais. E o Sr. Moroto também devia chegar a qualquer momento. Mas… depois de esperar um pouco mais, mesmo sem a chegada dos acima mencionados, iniciámos a eucaristia do matrimónio. Não! Não há marcha nupcial. Não há vestido branco. De facto a noiva trazia vestido um vestido verde e um kitamba (pano colorido africano) às costas, embrulhando o filhote mais novo do casal. Curiosamente a madrinha do casamento trazia o vestido igual ao da noiva.
A eucaristia começou com toda a gente a cantar ao ritmo bem africano, onde nem os tambores nem as palmas podem faltar. Tudo normal como em qualquer eucaristia no mato: com muita alegria. Até porque a comunidade desta capela, tal como as restantes 45, só têm a celebração da eucaristia 2 a 3 vezes por ano.
Chegou o momento do ritual do casamento. O P. Dolzan fez questão de explicar a todos os presentes o que queria dizer um casamento católico, uma vez que para muita gente, este casal já estava casado. Claro, da forma tradicional, pois claro. Mas para quê então outro casamento? É aqui que começamos a identificar a razão porque esta gente aqui em Pokot, quando pede um sacramento, sabe bem o que pede: a bênção e a graça de Deus para a sua família. É essa a razão primária do casamento na Igreja. Até porque aqui não há vestidos brancos, nem pompas e circunstâncias. É um testemunho lindo. Logicamente que o rito tem também que ser adaptado. Ou já imaginaram o padre perguntar que querem realmente casar quando já estão mais que casados tradicionalmente. E que dizer de ser abençoados nos filhos… pois sim que são! O Abraham e a Christine já levavam dois na sua conta!
Foi curioso notar que o auge da celebração matrimonial é precisamente o momento em que há a entrega das alianças… que, apenas de passagem, são trazidas pelo missionário! Ficando grandes ou pequenas pois são aquelas as alianças que são partilhadas com toda a alegria. E bom… escusado será dizer que nem de bronze são! São um sinal tão simplesmente um sinal da bênção recebida. E com que cuidado os casais usam as suas alianças. São o sinal visível que os recorda a bênção de Deus Töroröt.
Estávamos a meio da eucaristia, depois do rito matrimonial e antes do ofertório, quando se ouve ao longe um carro. Coisa rara nestas paragens! Chegava o ex-deputado Moroto! Cantava-se o cântico do Credo. Pois metade dos participantes continuaram a cantar o Credo. A outra metade foi em direcção ao carro, cantando e dançando, acolhendo o seu ex-líder à boa maneira africana. Como em África muita coisa se improvisa, o meu colega interrompeu a missa para que se pudesse acolher bem este VIP. Não que fosse o mais apropriado, mas… a tradição e a boa educação africana a isso o obriga pois claro!
Depois de tudo no seu lugar lá continuamos a missa que terminou já perto das 3 da tarde. E para quem pensa que já eram horas de ir ao tacho pois está bem enganado! Aqui os noivos não vão tirar fotografias dando uma seca aos convidados. Aqui, depois da eucaristia, é o tempo dos discursos por parte dos convidados importantes. Mais de uma hora de discursos e felicitações ao casal. Também nós os padres tivemos que dar uma palavrinha. E se não a damos as pessoas ficam aborrecidas.
Mas ainda não era tempo para a boda. Segue-se a entrega dos presentes feita em público. Um saquinho em cima da mesa com o casal e os padrinhos ali sentados a receber os presentes que as pessoas, na sua pobreza e humildade, trazem para o “novo” casal.
Por fim, já quase 5 horas da tarde, chegam os familiares dos “noivos”. Tinham conseguido finalmente desenterrar o camiãozito e lá chegaram mesmo a tempo de partilhar a comida preparada para os convidados: farinha de milho cozida (o famoso ugali), arroz cozido e carne de cabra cozida. Para beber um chazinho bem quentinho e a ferver. Um pitéu para os dias de festa!
E era hora de regressar. O meu colega tem já dificuldade em ver bem durante a noite e além do mais tínhamos ainda uns bons kilometros e uns 4 rios para atravessar. Ainda que secos nesta altura do ano, atravessar o leito destes rios é sempre uma aventura. Nada feito sem a tracção às 4 rodas. Porque trazíamos algumas pessoas da festa connosco de regresso ao centro que é Kacheliba, ainda tivemos que descarregar o carro por duas vezes para não ficar atascados na areia dos rios. O normal nas viagens por estas paragens.
Um dia diferente. Mais um. Como o são todos por estas terras quenianas.


Relatos da missão de Kacheliba – North Pökot – Quénia
14 de Dezembro 2008

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quarta-feira, dezembro 3

Rios de Água Viva... em Pokot!

Reparação de um furo/poço em Kapul - Kacheliba - North Pokot
Terça feira, 2 de Dezembro 2008. Logo de manhã fui com os trabalhadores a um lugar a cerca de 15km daqui num lugar chamado Kapul para repararmos a bomba de água que já não funcionava há 2 semanas. E o calor aperta de verdade. As pessoas, digo, as mulheres e as crianças, tinham que ir buscar água a um lugar que fica a 1 hora de caminho ou então entrar já no território do Uganda para buscar água. De facto este lugar fica a escassos 3-4Km da fronteira com o Uganda.
Saímos de manhã e foi um trabalho que nos levou até às 3 da tarde debaixo de um sol bem quente. De facto estou um pouco vermelhino ainda que não seja como quando vamos à praia, mas já se nota e bem a cor da pela bem mais morena!!! O trabalho de hoje foi para mim muito gratificante.
O furo tem cerca de 50 metros de profundidade e o que tivemos que fazer foi retirar todos os tubos e ainda o ferro interior da bomba para fora e ver quais os que estavam partidos e soldá-los (tínhamos levado a maquina de soldar com o gerador!) ou mesmo substituí-los. Depois de algumas horas de trabalho foi grande a alegria de todos os que ali estavam ao redor em ver que de novo tinham água. As mamãs não se cansavam de agradecer, assim como as cerca de 50 cabras que já ali esperavam para matar a sede, juntamente com os seus pastores, crianças e adolescentes, os pastores locais. Assim que muito me recordei da frase de Jesus “Eu Sou a Água Viva…” assim transformada para estes povos…
Bom os custos para fazer um furo artesiano são impressionantes… dependendo da profundidade, são necessários entre 8 a 9 mil euros. Ficam muito caros pois as máquinas para furar a terra bem como o material vêm de Nairobi… e vir para estas regiões remotas com todo o material, pois, não fica barato. Sabeis que só para o transporte do material vai quase metade do dinheiro… depois as autorizações que há que pedir e pagar ao governo para fazer o furo artesiano e registá-lo… creio que ser cobram algo como à volta de 400 euros!!! Mas há muita falta de água nestes locais e a missão como alguma outra igreja presente nesta região e em parte o governo estão empenhados em prover com mais furos junto das populações. É certo que é muito dinheiro mas são os custos que têm estas coisas.

Já, por exemplo, aquilo que vamos gastar nos primeiros 2 meses do ano por causa das escolas serão cerca de 250 sacos de farinha, feijão e grão de bico, que é o alimento nas escolas. Cada saco de milho de cerca de 90Kg custa à volta de 20 euros aqui. Ou custava porque já algum tempo que não compram farinha e feijão para as escolas e os preços aumentaram, embora estes dias parece que estão a baixar de novo.



Relatos da Missão em Kacheliba - North Pokot - Quénia

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Viajando até terra Pokot!

Deixando Nairobi…
24 de Novembro de 2008. 8h da manhã. Depois de presidir à eucaristia, pedindo a bênção do Senhor para a missão que hoje iniciava, saí de Nairobi com o P. Mariano, o actual provincial dos MCCJ no Quénia. Esta viagem é um marco importante na minha história vocacional. Marca o regresso a um povo e a um lugar que Deus elegeu para mim. Marca a realização de um sonho de vários anos. Sinceramente não sei bem o que é que Deus espera de mim ou que me pede neste lugar, junto deste povo e junto com esta comunidade missionária. Mas algum dia alguém disse: “a melhor missão do mundo é aquela a que Deus me enviou!” É certo que foi também um desejo pessoal. Não necessariamente a missão onde ser enviado, mas o tipo de trabalho junto com os Pokot, neste país. Porém, este chamamento faz parte de uma vocação já antes assimilada na minha vida. Durante o escolasticado senti que Deus me chamava a trabalhar junto com este povo. Um povo de Pastores. Um lugar semi-árido. Onde a electricidade pública está ainda a caminho (brevemente!) e onde as comunicações por telemóvel são ainda muito recentes. Entretanto, fiquei maravilhado em ver que os cabos da rede eléctrica pública chegam já a esta vila Pokot, Kacheliba. Porém, a ligação à electricidade não é ainda uma realidade. Ainda virão muitos testes dias com electricidade e outros sem ela. Porém, aqui vamos avançados: a electricidade que aqui existe na casa da missão é gerada por energia solar…
Depois de 480km, chegamos a Kacheliba, pelas 5,30h da tarde. Cerca de 9 horas de viagem a uma média de 50km por hora em estrada alcatroada, mas também muito má por muitos km. Os últimos 40km são em terra batida, descendo cerca de 600mt em altitude pela encosta da montanha situada perto da vila de Kapenguria e Makutano. A temperatura aqui costuma ser elevada devido a que a missão fica num vale, aliás como a própria vila de Kacheliba.
Esta vila fica situada a cerca de 1200mt de altitude e foi até há poucos meses a sede de concelho desta região do distrito de West Pokot. Neste distrito vive o povo Pokot, pastores por natureza. É atravessada por um rio, o Swam ou Turkwel. Um rio que mesmo nesta altura do ano (a mais quente e seca!) continua a levar alguma água no seu leito. Água da cor da terra, é certo, mas é água de todas as formas. A água, nestas paragens quentes e secas, é um tesouro! Aqui se pode ver os animais a saciar a sede, homens a tomar banho, mulheres a lavar a roupa, crianças e adolescentes a pescar e ainda pessoas a levar água para suas casas…
Nesta missão vivem três outros missionários, dois italianos e um alemão. Todos padres missionários combonianos. Desta vez apenas pernoitamos, eu e o P. Mariano, o Superior Provincial dos Combonianos aqui no Quénia. Sairíamos, no dia seguinte pela manhã em direcção a outra das nossas missões: Amakuriat, bem mais a norte, cerca de 100km.
Na missão de Kacheliba trabalham também as Irmãs Combonianas. Tomam conta sobretudo das escolas e do dispensário. Porém, estão neste momento a deixar esta missão – falta de pessoal para poder levar para a frente todos os compromissos… Espera-se a vinda de uma outra congregação de irmãs missionárias.
Também a missão tem electricidade a partir de um sistema solar. Tecnologias postas ao serviço da missão. Espera-se que a electricidade pública chegue a qualquer momento, uma vez que toda a instalação de cabos eléctricos está praticamente feita. Mas como dizemos por cá em língua swahili, Mungu anajuwa (Só Deus sabe!) quando a electricidade pública será uma realidade. Entretanto, para as necessidades básicas de energia da casa da missão, os raios solares abundantes neste lugar são transformados em energia eléctrica.
Primeira eucaristia na missão de Kacheliba
Logo na manhã, às 6.45h, rezamos todos juntos a oração da manhã juntamente com a celebração da eucaristia. Neste dia duas comunidades das irmãs combonianas tinham um encontro de trabalho. Por isso éramos bastantes na celebração da eucaristia. Eu apenas concelebrei. Foi o superior da comunidade, o P. Guiducci a presidir à eucaristia. Senti naquele momento uma alegria grande por estar ali, finalmente, na missão que Deus me indicou. Ofereci ao Senhor tudo o que sou e tudo o que Deus me deu como qualidades para serem postas ao serviço deste povo e desta missão que Deus me confia.
Depois do pequeno almoço, saímos rumo a Amakuriat. Fizemos um desvio pela missão de Amudat, que fica já em território do Uganda, com quem o Quénia faz fronteira. Apesar de ser uma missão entregue aos padres diocesanos do Uganda, esta terra continua a pertencer à terra dos Pokot. Como pode um povo estar assim dividido entre dois países? Pois são os erros dos passado… erros dos europeus no traçado das fronteiras a régua e esquadro no séc. XVIII, sem ter em conta a realidade destes povos, então quase desconhecidos! No caminho, enfrentamos as tropas ugandesas. Regressavam de resgatar centenas de cabeça de gado que tinha sido roubado pelos inimigos dos Pokot (os Karimojong) uns dias antes. Fomo-nos cruzando ao longo da estrada com vários grupos de soldados. Param-nos para pedir água. “Vimos da operação e caminhamos sob este sol escaldante há 2 dias”, disseram-nos. Infelizmente, a estratégia do governo ugandês em terminar com estes ataques entre inimigos através da colocação de tropas no local não é eficaz. Ir roubar gado ao inimigo está no sangue destes povos há centenas de anos. Não chega apenas uma operação militar. É necessário educar as pessoas. Mas isso, é algo que tem mais custos. Construir escolas, pagar professores, etc. sai muito mais caro… Infelizmente esse é um campo de trabalho muitas vezes deixado só a cargo dos missionários.
Amakuriat: “matar saudades missionárias”
Chegamos a Amakuriat, a missão mais a norte dos Missionários Combonianos em terra Pokot para a hora do almoço. Fiquei surpreendido com o aumento de casas e edifícios com telhados de chapa de zinco. Tinham passado cerca de 7 anos desde que aqui tinha estado desde a última vez. Uma outra novidade foi o facto de aqui existir uma rede de telemóvel a funcionar. Aqui, onde nem sequer existe uma rede eléctrica pública nem sequer a rede de telefone fixa. De facto, a globalização é algo de extraordinário. Foi também entretanto construída uma escola secundária que tem neste momento cerca de 400 alunos.
Nestes dias que passei nesta missão já por mim conhecida, pude dar umas voltas saudando e reconhecendo também pessoas que tinha deixado há 7 anos. Hoje mesmo, 27 de Novembro de 2008, fui com o Irmão Friedbert, missionário comboniano a trabalhar nesta missão, a um lugar chamado Nauyapong, que fica já no limite com a tribo vizinha, os Turkana. A missão está ali a construir mais umas salas de aula na escola primária. A escola alberga mais de 300 estudantes que têm que pernoitar ali, uma vez que a maioria vem de lugares distantes. Os rapazes que são cerca de 120, dormem todos num único edifício que não terá mais de 25mt por 15mt de largura! Mas ter a oportunidade de vir à escola em terra Pokot é um luxo que nem todos podem gabar-se!
No caminho de regresso, já a poucos km do centro da missão, parámos numa pequena capela onde também se está a iniciar a escola primária. Aí encontramos um jovem que não teria mais do que 16 anos. Tinha casado no dia anterior com a sua primeira mulher. Tinha pago pela sua esposa 30 vacas como dote. Olhando para o lado vi também uma jovem com mais ou menos a mesma idade. Reparei que trazia a pulseira que só as mulheres casadas podem usar. Perguntei-lhe se era casada. Logo respondeu que sim. Não tardou que outras mulheres que ali estavam me olhassem e oferecessem também uma das jovens ali presentes para casamento! Sem querer ficar mal e entrando na brincadeira, perguntei quantas vacas desejariam para o dote, ao que me responderam 50! Lá lhes fui dizendo que era padre missionário, que não casamos e muito menos temos vacas para pagar como dote.
Hoje era também dia de mercado. Dia que traz muita gente ao centro de Amakuriat e por isso perto da missão. Um dos lugares especiais nos dias de mercado é o lugar onde as pessoas se juntam para beber a cerveja tradicional. Chamam-lhe “busa”. Trata-se de uma cerveja feita de milho fermentado que até nem traz muito álcool. Mas por pouco que seja é suficiente para por esta gente contente. Fui até ao local onde costumam beber. Segundo informações que tinha era junto ao rio, uns 500mt abaixo da missão. Porém, tinham-se movido. A polícia tinha andado atrás destas pessoas por ser um negócio ilícito. Não é costume ver um msungu (um homem branco) naquelas paragens. Por isso não faltavam os miúdos à minha volta… brinquei com eles mostrando-lhes as imagens que entretanto ia tirando com a máquina de filmar. Perguntei-lhes onde estavam as pessoas, o mercado da cerveja, “pombe’s place”. Fizeram questão de me acompanhar até ao local. Fui-me aproximando e fui vendo centenas de pessoas, mulheres a vender e também a beber. Homens às dezenas, juntos ali a passar o tempo e na amena cavaqueira. Já se percebia algum mais enfrascado que outro! Acompanhado por alguns jovens aventurei-me a dirigir-me em swahili a um dos anciãos que ali estavam. Em questão de minutos foram mais de 15 as pessoas ali à minha volta a falar com este senhor. Foi-me dizendo que tinham casado com mais de 10 mulheres… talvez exagerando um pouco! Perguntei-lhe quantos filhos tinha. Respondeu-me que as suas mulheres tinham tido mais de 100 filhos. As suas mulheres… sim porque um homem pokot, por natureza não liga muito aos seus filhos. Se são filhas melhor! Quando elas se casarem conseguirá mais animais para a sua “conta”. Sim porque em terra pokot, aquilo que vale realmente são os animais. É como ter dinheiro no banco nos meios mais desenvolvidos. Aqui ter muitos animais e muitas filhas é sinal de que se é um homem rico. Disse-me este homem que as suas mulheres lhe tinham dito bem da igreja e que também era bom ter os filhos na escola. Por isso mesmo enviava as suas mulheres à Igreja e os seus filhos à escola também. Fui-lhe dizendo que era bom que assim procedesse, mas que a Igreja não é só para as mulheres e as crianças. Que também os homens têm lá um lugar! Tradicionalmente e talvez também devido a erros de evangelização do passado, não é muito comum ver os homens na igreja.
Por muito mau que seja o hábito de beber, para muitas mulheres que ali vêm vender os poucos litros de cerveja tradicional fermentados por elas em casa, é a única maneira de conseguir ter mais alguns rendimentos para alimentar os seus filhos. O pai, em muitas situações, é por e simplesmente um ausente para tudo!
Enfim… foi um momento de realmente poder ali dar umas palavras de alento e ao mesmo tempo de intervir numa situação em tudo nada famosa. O hábito de beber não ajuda em nada uma sociedade já de si bastante fechada e pouco aberta à novidade e à mudança. É por isso necessário também estar nestes lugares e dar testemunho daquilo que Jesus veio indicar-nos: “Vim para que tenham vida, e vida em abundância!”
Missão de Amakuriat, Quénia – West Pokot, 25 a 27 de Novembro 2008

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