sábado, fevereiro 7

Língua que também é usos e costumes!


Não basta falarmos a língua local para entendermos as pessoas e nos fazermos entender! Esta é uma “lição de vida” que todos @s missionári@s acabam por aprender mais cedo ou mais tarde. Até porque é uma realidade na vida de todos os povos… Essa é a razão pela qual, aqui na escola da língua swahili, aprendemos também os usos e costumes locais. A língua, ainda que bem falada com todas as regras gramaticais, não chega se depois é usada de forma errada e fora de lugar.

“Nunca entregues nada a alguém com a mão esquerda! Nem muito menos saúdes alguém com essa mão!” “Já fiz asneira!”- ouve-se na sala de aula da boca de um dos meus colegas. É esquerdino. Uns dias antes tinha visitado uma família local… tinha estranhado que as pessoas tivessem uma atitude rara ao demorar tempo a aceitar umas peças de fruta que ele levava como presente. Agora entendia porquê: sendo esquerdino entregou a fruta com a mão esquerda…
O Frank é um dos meus 19 colegas estudantes da língua aqui na «shule wa lugha ya Makoko» (escola da língua de Makoko – nome da localidade onde se encontra a escola). Padres, irmãs e leigos missionários, bem como duas leigas missionárias protestantes. As nacionalidades são quase tantas quantos os estudantes: EUA, Haiti, Trinidade e Tobago, Madasgascar, Gana, Nigeria, Bélgica, Irlanda, Filipinas, Itália, Alemanha, Polónia, Suiça, Roménia e, claro… Portugal que na língua swahili se diz “Ureno”. Numa próxima oportuniddade dir-vos-ei porquê. Todos pertencemos a diferentes congregações religiosas, como as chamo eu, “sindicatos religiosos”. Somente nós Combonianos e o Romeno (sindicato - Fidei Donum), trabalhamos no Quénia. Todos os outros, religios@s e leig@s missionári@s, trabalham aqui na Tanzania.
Numa variedade tão grande de culturas e tradições, é natural que os usos e costumes locais sejam mais estranhos para uns do que outros. Porém, é bonito ver como há Alguém, há uma Razão, há uma Missão e Vocação que nos une a todos. O Amor de Jesus é o motor da entrega das nossas vidas. Independentemente da raça, da cor, da cultura, dos costumes e das crenças religiosas, há Algo que nos une. E isso ninguém, nem mesmo os, assim ditos, ateus (como dizem alguns, graças a Deus!) podem negar.
Temos aulas de orientação cultural aqui na escola uma vez por semana. São vários os assuntos que vamos abordando cada semana. Nestas aulas pretende-se que entendamos os usos e costumes que as pessoas têm no seu dia a dia, de modo a que possamos estar o mais possível em sintonia e perto da realidade que nos circunda.
A semana passada falamos sobre os costumes locais da Tanzania. Em todo o país há mais de 120 tribos diferentes. Só aqui na diocese de Musoma são 12. Cada uma com os seus costumes e tradições. Já vos falei acima sobre o uso das mãos. Ao chegar a qualquer casa de uma família nativa, é normal que logo tenhas que aceitar algo para comer ou para beber. E é considerado uma ofensa grave não aceitar. Nem pensar em faltar a uma visita a uma família sem avisar! É que já teremos à espera comida preparada em abundância. Sobretudo sendo a visita @ missionári@. Será uma desfeita muito grande não aparecer, e sobretudo deixar a família e a refeição “pendurados”… O primeiro sinal que nos dá o alerta de que é hora de nos sentarmos para a refeição é a frase “Karibu chakula”, isto é, benvindo para a refeição. Claro que tudo isto é antecedido por uma longa saudação e ambientação sobre como vai a vida da família e d@ missionári@. Logo de seguida chega a bacia com uma jarra de água. Há que lavar bem as mãos, pois aqui não há garfo, nem faca nem colher. Temos uma colher natural que é a mão direita, como nos dizem. E atenção… apesar de se comer com a mão direita somente, há que lavar bem ambas as mãos.
É normal a mulher e as crianças raparigas não comer junto com o marido e os filhos. Apenas o marido, os filhos rapazes e os convidados comem na sala principal. A esposa e as filhas, além de comerem na parte da casa a que chamam cozinha, comem também no chão, encostadas a uma parede da casa. Mas porquê, perguntamos? É a tradição… Claro que nas famílias das zonas mais citadinas estes costumes estão a alterar-se… dirão uns graças a Deus e outros… que pena!
É também impensável que um homem cozinhe para a sua família. O trabalho da cozinha é para a mulher. E eu perguntei: mas então os cozinheiros homens aqui da escola não o poderiam fazer?!? “É o seu trabalho!”- foi-me dito. Mas em casa não o podem fazer…
O tema divergiu depois para os direitos da mulher no país. Obviamente que muitas das nossas irmãs missionárias aqui no curso pouco faltou para ficarem escandalizadas. Uma mulher deve saudar o homem e sobretudo se é mais velho, abaixando-se, saudando “Shikamo!” e nunca olhar directamente ao homem com quem está a falar. O mesmo se diga de um jovem para um ancião. Claro está que os mais jovens vão mudando as tradições… como em muitos outros lugares no mundo! Juventude irreverente. Porém, o respeito é algo que aqui é ainda muito apreciado… ainda bem!
Um outro costume é o de regatear os preços. Ainda hoje mesmo, no mercado, o meu colega P. Kizito, tentava comprar uma tomada eléctrica. Começaram-lhe por pedir 25 mil xelins, cerca de 14,50€. Uma tomada simples que não valeria esse preço. Depois de regatear o preço acabou por ficar nos 10 mil xelins, nada mais nada menos que quase 6 euros! Mas é assim por aqui nestas paragens! E como já diz o velhinho ditado romano: “Na terra onde fores ter, faz como vires fazer!”Até breve e… cuidado com o trocar de mãos… se por acaso vieres a visitar estas paragens. Kwa herini! Mungu akubariki (Adeus! Que o Senhor vos abençoe!)

Rua principal da cidade de Musoma - Tanzania

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