domingo, maio 31

Começando a entrar nos esquemas… da missão!

Hoje, 24 de Maio, dia da Ascensão do Senhor, presidi e fiz a homilia em Kiswahili pela primeira vez. Celebrei duas missas. A primeira foi com os estudantes da escola internato aqui da missão, a escola primária. Começamos pelas 8.15h e depois a missa seguinte às 10,30h, ainda que a hora de começo na verdade é às 10.00h. Mas estamos em África!!!
Aspecto da celebração da missa na Missão de Kacheliba

Esta segunda missa é com as pessoas aqui de Kacheliba e ainda os alunos da escola secundária também aqui da missão. É também uma escola de internato. Muitas das escolas aqui são internatos pois as pessoas vivem muitas vezes bem longe das escolas e por isso têm que enviar os filhos para a escola e ficar em regimes de internato… no entanto as condições não são nada comparáveis aos nossos colégios internos… nem por sombras! É a necessidade que faz termos os internatos.
Senti-me de verdade muito bem. Penso que os 4 meses que foram investidos na aprendizagem da língua foram bons. Eu tive que me preparar escrevendo a homilia, pensando ler nas missas. Sim, li um pouco mas a um dado momento pus o papel de parte e fui por aí fora. Mais de acordo com gramática ou menos, o importante é que as pessoas no final da missa me disseram que entenderam bem o que quis dizer; diziam ter entendido bem a explicação do evangelho. Posso dizer-vos que sentia um pouco de medo ao começo. Não é o mesmo que o inglês ou muito menos que o Português… mas sinceramente senti que tantos os alunos como as pessoas me seguiam. Pelo menos iam respondendo também ao que lhes ia perguntando durante a homilia… Creio que este foi um primeiro passo que dei e que agora será já com mais e mais confiança. Além do mais, o kiswahili aqui do Quénia não é o kiswahili dos professores na escola da língua… é muito mais fluente e por vezes as regras gramaticais não existem… Assim que me sinto muito feliz por mais este passo na inculturação e na introdução da vida missionária.

Crianças Pokot durante uma celebração
numa das capelas... ao ar livre!

Visitas às capelas
Ao longo desta semana pude visitar com o meu colega Hubert, várias capelas bem como escolas das quais somos os “patrocinadores”, aqui dizem em inglês, sponsors! Em toda a paróquia creio que são há volta de 20 escolas primárias de quem somos “sponsors”, ou seja, foi a missão a começar as infra-estruturas. Muitas delas não têm ainda as salas de aula para os 8 anos que compõem a escola primária aqui no Quénia. As escolas sempre foram uma das grandes prioridades da missão, depois do trabalho de evangelização. Há 30 anos não existiam praticamente escolas nenhumas aqui na zona.
Na sexta-feira, dia 22 de Maio, eu e o Hubert saímos daqui da missão ao final da manhã para uma reunião numa das escolas não muito longe aqui da missão. Uns 20 minutos de carro. Porém, por causa de um grande rio que enche e é bem largo quando chove (como estes dias!) torna este lugar quase inacessível para lá chegarmos de carro. Neste dia a “estrada-picada” até não estava nada mal. A reunião começou pelas 13.30h. Era uma reunião com o representante da área do ministério da educação. Há aqui em cada escola uma espécie de Comissão Escolar, o que em Portugal seria o Conselho Pedagógico, de que fazem parte o “sponsor”, o director da escola, representantes do governo e pais. Isto parece tudo muito oficial e pomposo, mas na realidade são comissões constituídas pelas pessoas do lugar. O problema era que a anterior comissão era provisória. Numa dessas comissões, imaginem, o presidente era uma pessoa cega, um dos pais, e o tesoureiro não sabia ler nem escrever… Parece anedótico… mas era verdade! Não é que seja mau que as pessoas diminuídas fisicamente ou culturalmente façam parte destas comissões… pelo contrário, mas a preparação destas pessoas aqui não é a mesma que o mundo ocidental muitas vezes oferece. Parece que a anterior comissão conseguiu dinheiro de um fundo monetário do governo e construíram a escola com salas de aula novas. Antes a escola funcionava em apenas 2 salas de aula construídas há uns anos atrás pela missão. Muito bem! Chamaram um construtor local para o trabalho… das 8 salas de aula apenas 4 podem ser usadas pois as outras estão a ponto de cair… sem nunca terem sido usadas! A construção foi muito pobre. A reunião começou debaixo de umas árvores no terreno da escola. Nas reuniões aqui todos falam, bom… pelo menos os anciãos e os homens. As mulheres é-lhes dada voz já depois de todos terem falado e dado a sua opinião… infelizmente, pois muitas vezes são as mães as grandes interessadas na educação das crianças. A um dado momento, depois de já 3 horas de reunião, a chuva ameaçou! Fomos todos para dentro de uma sala de aula. E a reunião continuou até às 6.30 da tarde, ou seja, depois de 5 horas de reunião, foi constituída uma nova comissão escolar. Aquilo que mais me chamou a atenção é a forma como as pessoas têm a capacidade de resolver problemas entre eles… Os anciãos são de verdade pessoas cheias de experiência e muitas vezes são os grandes construtores da união entre este povo. Mas também se dão para o torto, são os principais factores de desavenças entre as pessoas… O importante é que no final todos estávamos contentes com o resultado da reunião. Este ano a escola tem apenas duas classes-anos a funcionar, muitas vezes com poucos alunos, como estes dias. Isto porque tradicionalmente os Pökot não são ainda muito abertos à educação das crianças. Muitas vezes enviam as crianças à escola pois, pelo menos na escola, geralmente, as crianças podem ter uma refeição. Apesar de que neste tempo de fome, sabemos de escolas a quem o governo não enviou comida suficiente e os alunos não têm muito para comer. Esta escola é uma delas…
Anciãos Pokot - os "juízes" locais

Também temos problemas logísticos...
Na quarta-feira anterior também tivemos uma outra reunião numa das nossas capelas. Desta vez bem mais longe daqui da missão. Mais de um hora por caminhos que só são “arranjados” quando o missionário vem para visitar a comunidade. Por fim lá chegamos. Desta vez o problema era diferente. Há 20 anos o terreno para a construção da capela foi doado ou comprado pela missão (não sabemos!). É cerca de 1 hectare. O ancião morreu há 2 anos. A sua mulher (parece que este só tinha uma ao contrário de muitos outros!) juntamente com os filhos (um deles é guarda em Mombasa… a 1200km daqui!) reclamam o terreno, ou querem apenas que o terreno da capela fique reduzida a um espaço de ¼ do hectare… Certamente que este caso é, aí em Portugal, um caso de tribunal… até porque não sabemos se há algum acordo escrito ou não deste terreno. De qualquer forma o terreno é dos cristãos desse lugar e por isso terão que ser eles também a decidir junto com os anciãos como resolver este problema. E mais uma vez, é linda a forma como as pessoas se escutam! Todos intervêm (normalmente os homens, ainda que aqui foram também as mulheres que são muitas vezes as que vêm mais à Igreja… tal como aí em Portugal!). Escutam-se, procuram clarificar coisas e por fim os anciãos são os juízes que decidem o que fazer. Até o chefe local representante do Governo nesta localidade, uma espécie de presidente da junta, está na reunião, mas são os anciãos aqueles que têm o poder tradicional de decidir. Desta vez parece que a pobre senhora e os filhos não vão conseguir muito, uma vez que os anciãos pareciam perguntar-lhes… porque é que esperaram que o velhote morresse para reclamar?!?! No entanto adiamos a decisão até uma outra reunião com eles em Agosto para procurarmos bem pelo documento ou acordo de utilização do terreno para a capela. Mais uma vez… foram os anciãos aqueles que procuram decidir as coisas. Tivemos ainda tempo de visitar a escola dessa localidade… com 8 salas de aulas, mas as paredes são feitas como as cabanas nesta área… só que com chapa de zinco por cima. Estão a planear, com a ajuda da missão e do governo, eles mesmos construir uma escola com condições mais permanentes. Veremos…
Na quinta-feira tivemos ainda outra reunião numa outra capela, junto com os cristãos e os anciãos para procurar um substituto do catequista para aquela capela… como vedes… muitas reuniões… muitas coisas até a parecer muito oficiais… mas todas debaixo da árvore… está-se melhor e mais frescos!
Anciãos Pokot durante uma celebração comunitária

Muitas pessoas não têm que comer em casa
Mas até hoje, aquilo que mais me tem chocado e até feito pensar muito é que em todos os lugares que vamos as pessoas pedem-nos ajuda. Este tempo é de facto um tempo em que muitas pessoas estão a passar fome. As últimas colheitas foram muito escassas e além do mais há já muito tempo. Todos os dias pela manhã e durante o dia temos pessoas aqui à porta a pedir ajuda. Certamente que algumas delas talvez não necessitam assim tanto, ou não querem fazer nenhum… e aí está a grande dificuldade que me parte o coração… saber quem realmente necessita. Graças a Deus tem chovido bastante e vemos que muitas pessoas têm cultivado bastante. Diz o Hubert que mais do que em outros anos. Porém, até que o milho, o centeio ou a cevada (uma espécie de cevada!) cresçam e estejam prontos para serem transformados em alimento, ainda temos os meses de Junho e Julho. As colheitas começam apenas para meados de Agosto. E digo-vos sinceramente que este tem sido o maior desafio que tenho experimentado desde que cheguei aqui à missão. Nesta semana terminei de escrever uma lista de 616 pessoas que em toda a paróquia estão necessitadas. São listas que os catequistas nos trouxeram das capelas. Não incluímos na lista toda a gente pois todas as listas tinham cerca de 2000 pessoas! Pedimos-lhes que indicassem apenas aqueles que estão mesmo necessitados por serem idosos, doentes ou incapacitados. Entregámos essa lista ao Sr. Bispo pois ele mesmo prometeu ajudar com alguns sacos de milho. Estes dias, recebemos a confirmação de que o Sr. Bispo vai enviar cerca de 100 sacos de milho, cerca de 9000kg de milho. Também nós, aqui na missão, comprámos também outros 100 sacos de milho. Ao todo são cerca de 18mil kg de milho. Iremos distribuir pelas 52 capelas 3 sacos (270kg) para serem distribuídos por aquelas pessoas necessitadas. Serão os nossos catequistas a distribuir. Ficaremos com um maior número de sacos aqui na missão pois é onde mais pessoas vêm pedir ajuda. Não é muito, mas pelo menos é um pequeno gesto que ajudará a aliviar um pouco estes tempos de dificuldade. Cada saco custa-nos cerca de 27 euros, pelo que será uma boa maquia, mas cremos que bem empregues para ajudar esta gente. Calculamos que os 200 sacos de milho possam dar para sensivelmente 55 mil refeições. Isto quer dizer que podemos alimentar cerca de 900 pessoas durante estes dois próximos meses, até às próximas colheitas, se Deus ajudar com a chuva. No entanto, este é um trabalho de distribuição sempre muito difícil… quem é que não está necessitado estes dias?!?!
Na verdade, as necessidades são muitas, e dou-me conta também que entre as pessoas mesmas, aquelas que podem e têm um pouco mais porque têm trabalho aqui no centro ou mesmo na missão, elas mesmas ajudam muitas outras pessoas. É o caso da nossa cozinheira e da cozinheira das irmãs, ou o nosso construtor, também ele africano, que todos os dias alimentam a muitas outras pessoas também… situações que de facto nos fazem pensar…
Mas como dizemos aqui em kiswahili, “Mungu atatusaidia kwa sababu anatupenda sana”, ou seja, “Deus ajudar-nos-á porque muito nos ama!”

Ugali - comida típica africana: farinha de milho
preparada aqui para o "manjar" de um casamento

E a vida na missão continua… sempre com as vossas orações amigas! Bem hajam! Sörö nyo man – Muito obrigado em língua pökot.
"Pensamentos do meu diário"
Kacheliba, 24 de Maio 2009
Festa da Ascensão do Senhor

Etiquetas: , , , , ,

domingo, maio 24

Regresso em cheio!

Eis-me de regresso à terra Pökot – Kacheliba! Depois de 4 meses de estudo intensivo da língua kiswahili na Tanzania, eis que é chegado o momento de me instalar definitivamente na missão.Poderia dizer que os meus dois primeiros dias deste regresso foram um aperitivo bastante apaladado: eucaristia debaixo das árvores, crianças a aprender a ler e a escrever debaixo de outras árvores, ser bons samaritanos e ajudar a polícia a desenvencilhar-se da sua pick-up atascada no rio, furo no nosso carro, cruzar o rio a pé antes de nos aventurarmos com a pick-up…, enfim… aquilo a que chamaria a vida de um missionário aventureiro no tempo das chuvas por estas paragens. Mas a Missão é muito mais do que isto…

Regressei a Kacheliba no dia 13 de Maio. Não! Não o escolhi de propósito. Apenas e tão somente aconteceu. Alguns dos nossos jovens lusitanos costumam dizer “correu mal” quando algo não saiu da forma esperada. Bom… no meu caso diria “Não podia ter corrido melhor!” Talvez (ou será mesmo isso) Deus queria dizer-me que a sua bênção por intercessão de Maria estaria sempre comigo. Senti que Maria chegava comigo a Kacheliba nesse dia. E por isso não devo temer seja o que for. Não fosse eu um bom portuga e devoto de N. Sra. de Fátima.
O meu superior e colega de missão, P. Giancarlo Guiducci já estava à minha espera em Kitale. Esta á a cidade mais próxima da nossa missão onde costumamos ir às compras. Fica a 80km de Kacheliba. 40 dos quais em estrada alcatroada. Os restantes 40 são em terra batida. Mas… encontrei a estrada muito melhor do que a deixei em Janeiro passado. Aqui trabalhou-se durante estes meses.
Surpresa das surpresas… à minha chegada o meu colega P. Hubert tinha preparado um bolo para celebrar a minha chegada. Digamos que um pedacito de bolo aqui nestas paragens é de facto uma raridade. Nesse dia também jantámos com a comunidade das irmãs franciscanas, a nova congregação que entretanto veio trabalhar aqui em Kacheliba depois da partida das Irmãs Combonianas em Março passado. É uma comunidade pequenina a das irmãs: duas irmãs africanas, a Irmã Agnes e a Irmã Ciprian. Uma é a encarregada do dispensário ou Centro de Saúde aqui da missão. A mais jovem, a Irmã Ciprian dá aulas na escola primária da missão. Desde logo me senti em casa. A Mama Tereza, a senhora que ajuda as Irmãs nas lides da casa, lançou-me um sorriso de alegria do meu retorno de tal forma que logo percebi que era bom sentir-me em casa de novo.
Logo pela manhã do dia seguinte saí com o meu colega P. Hubert. Fomos visitar uma capela que foi começada há bem pouco tempo, há poucos meses. Tão poucos que ainda nem sequer se prevê a construção da capela. Graças a Deus, na nossa paróquia podemos chegar a todas as capelas com a pick-up. Ainda que para isso algumas vezes seja necessário sair do carro e com a machada, cortar uns arbustos ou árvores que entretanto cresceram no meio do caminho. Outras vezes, no tempo das chuvas, temos que atravessar rios sazonais. Desta vez não fomos nós a atascar-nos no rio… já alguém lá estava a “dar de beber aos cavalos” (do jipe)! Nada mais nada menos que o carro da polícia. Escoltavam um outro jipe das Nações Unidas para chegar até uma escola a menos de 1km do rio. A UN anda a fazer um levantamento das escolas que recebem ajuda para a alimentação das crianças. Há que arregaçar as calças (as mangas não pois aqui anda-se sempre de manga curta!), tirar as sandálias e meter-se ao riacho para ajudar a resolver o assunto. Mais ou menos tempo decorrido, sempre se arranja maneira de retirar de lá o jipe. Fomos à nossa vida e chegámos à nossa capela com o nome bastante simples de Katukumwok. Fácil de pronunciar não? Debaixo de umas árvores, estava uma cadeira e um banquito. “Podemos celebrar aqui?” – perguntou o catequista. “Claro que sim!” – respondemos de imediato. “Uma mesa e outra cadeira estão a caminho” – retorquiu ainda o catequista. Mais tarde vi que a mesa tinha sido transportada à cabeça por uma das senhoras desde uma distância de pelo menos 2km!
A uns metros dali estava a escola pré-primária… claro está também debaixo das árvores. Contei as crianças: 23! “Mas são muitas mais” – disse-nos o professor. “Os outros estão com os pais nos campos! Por isso não puderam vir. Estão com os pais a ajudá-los a cultivar os campos!” Crianças de 4, 6, 7 anos? – pensei. É verdade! Estamos no tempo das chuvas e como aqui as chuvas são também escassas e incertas muitas vezes, há que aproveitar o tempo e as chuvas para plantar um pouco de milho e de soja. Os Pökot, por natureza e tradição, não são agricultores. São pastores. Mas há já bastantes que começaram também a cultivar terrenos. Um dos frutos de 30 anos de trabalho missionário também nestas paragens. Foi bonito por isso ver pelo caminho fora as pessoas nos campos. Sente-se a esperança no ar, a esperança de poder recolher algo dos campos. A alegria do dom das chuvas, dádiva de Ilat – o espírito das chuvas – um dom maior do Deus Töroröt, Deus Único em língua Pökot.
Voltamos às crianças da escola pré-primária. Quiseram presentear-nos com uma canção a Maria. Ao princípio estavam um pouco envergonhados. Raramente vêem o missionário e muito menos um branco. Lindo! Um ritmo e uma cadência no canto que deixariam algumas bandas rock envergonhadas!
Começamos a eucaristia. O meu colega celebra a missa em língua Pökot, mas tudo o resto é em língua swahili, depois traduzida para Pökot pelo catequista. Sim… é verdade! A língua kiswahili em vários lugares da nossa paróquia/missão não é suficiente. Especialmente as senhoras e os anciãos, que não foram à escola, falam apenas o Kipökot. Sim! Adivinharam… dentro de alguns meses tentarei também aprender o Kipökot… outra língua mais! Apenas e só que esta é bem mais difícil que o kiswahili. Veremos!
É normal que as pessoas aqui celebrem a missa com todo o à vontade e também com tudo aquilo que são: simples e puros, celebrando a louvando a Deus Töroröt com toda a alegria e simplicidade. As mães com o seus filhotes ao colo, muitas vezes até a serem amamentados, seguem as palavras do meu colega P. Hubert como alguém que deseja saber mais e mais sobre o amor de Deus por eles e por toda a humanidade. É confortante saber como, mesmo no meio de tanta simplicidade, há nestes corações dos Pököt uma ânsia de conhecer e saber mais sobre Deus, sobre Jesus, sobre a nossa vida voltada para Ele. Na Europa e no mundo assim dito “civilizado” Deus já passou de moda… já não precisamos dele (pelo menos assim pensam alguns!). Aqui, conhecer Deus e escutar como Ele nos ama mesmo nas mais degradantes situações, é um privilégio que muitos Pököt não têm acesso.
No regresso à missão, já a meio da tarde, pude também observar a apanha dos “kumbekumbe”, uma espécie de insectos que são um dos melhores petiscos cá destas terras no tempo das chuvas. Normalmente nascem e crescem dentro dos formigueiros. Há toda uma técnica especial para os apanhar. Secam-nos ou torram-nos e depois serve-se frio com uma pitada de mais nada. Assim mesmo. Crus. Tenho que experimentar um dia destes… pode ser que me saibam a saudosas moelas ou pataniscas!
Regressámos à missão sem outras complicações, graças a Deus. Pelas 4 e tal da tarde tomamos o nosso almoço quase como nos casamentos… mas olhai que aqui não houve casamento nem aperitivos em casa da noiva antes da cerimónia… Houve sim alegria! Pelas 6 da tarde a capela estava quase cheia na celebração da missa com os jovens da escola secundária para a missa que celebramos com eles todas as quintas-feiras. Uma alegria e jovialidade como poderão imaginar.
O dia não podia terminar sem outra situação do dia a dia da missão. Todos os dias o gerador da missão é ligado pelas 7 da noite até às 9 e pouco uma vez que aqui nesta missão ainda não temos electricidade pública. Temos cerca de 300 jovens da escola primária e secundária da missão nos internatos. É necessário por isso prover-lhes com alguma luz para o estudo nocturno também. Nesse dia o gerador não queria começar… levamos o carro para ligar a bateria pensando que poderia ser da bateria do mesmo gerador. Nada! Verificámos tudo e nada… bom tudo não… quase tudo! Afinal era um dos fusíveis que estava queimado. É que aqui não temos as páginas amarelas para ir procurar um técnico para nos resolver o problema… ou o resolvemos nós ou então ninguém o resolve… O “busca-busca” do problema não foi à luz da vela mas sim à luz das pilhas ou foxes como assim chamamos na minha terra. Só faltava a música psicadélica como nas discotecas…
No dia seguinte dirigimo-nos para a outra missão comboniana nesta região Pökot. Encontramo-nos com os outros missionários e missionárias para um dia de retiro. Escusado será dizer que o carro vai sempre cheio de pessoas. Há sempre gente a querer movimentar-se e a pedir boleia. Felizmente hoje em dia já há alguns transportes públicos mas algumas pessoas não podem sequer pagar a viagem assim que se dirigem aos missionários para pedir boleia. Levamos connosco um dos nossos catequistas, dois estudantes combonianos que farão a sua experiência missionária nessa missão, e mais algumas pessoas. São cerca de 120km em estrada de terra batida… às vezes, no tempo das chuvas, não tão batida quanto seria desejável, pois em vários momentos tivemos que sair fora da estrada-picada para fugir à lama e poças de água que nos poderiam deixar atascados. Felizmente conseguimos passar todos os possíveis problemas com maior ou menor facilidade. A um dado momento chovia que “Deus a dava”! Pobres pessoas que iam atrás na pick-up. Tivemos que parar para recolher-nos por uns momentos numa das cabanas perto da estrada. Chegámos até bem perto da missão. Mas havia um último obstáculo: atravessar o rio que levava alguma água no seu leito, suficiente para nos fazer esperar uma meia hora. Atravessámos o rio várias vezes a pé. É a primeira coisa que tem que ser feita ao queremos atravessar um rio. Tirar de novo as sandálias, arregaçar as calças até acima do joelho e meter-se rio dentro. Eu e o meu colega Hubert, assim que entrámos no rio a pé, logo concordámos que haveria que esperar para ver se o rio baixava…
Entretanto tivemos tempo de ainda pôr no devido lugar o pneu que tínhamos furado uns quilómetros antes… mas os furos aqui são “tão naturais como a sua sede” – como dizia a publicidade.
Por fim, achamos que poderíamos atravessar… já depois de mais de meia hora de espera. E lançamo-nos ao rio… sempre numa incerteza mas com a certeza suficiente de que poderemos atravessar sem muitas dificuldades. Pulo aqui e pulo acolá, lá conseguimos atravessar para alívio dos que vinham connosco, bem como nosso também.
No dia seguinte, o retiro foi oportuno para agradecer a Deus pela boa viagem que tivemos… por nos ter permitido chegar bem a Amakuriat, o nome da outra missão comboniana em terras Pökot. Aqui está mais uma comunidade missionária comboniana entre o povo Pököt: 3 sacerdotes e 4 irmãs missionárias combonianas.
Legendas fotos:
Foto 1: Crianças referidas no artigo da escola debaixo da árvore em Tandopos
Foto 2: Mães Pokot referidas no artigo na comunidade de Tandapos
Foto 3: Crianças Pokt durante a missa em Tandapos
Foto 4: Escola primária com 8 salas de aula em Lokornoi

Kacheliba, terra Pökot (Quénia) – Maio 2009

Etiquetas: , , , , , , , , ,

terça-feira, maio 5

Retalhos da minha vocação...

Este é um trabalho preparado pelo grupo de jovens U'Trilho de Nogueira do Cravo, Diocese do Porto - Portugal. Retrata alguns dos passos da minha vida até à minha partida de regresso ao Quénia em Novembro passado (2008). Foi apresentado no magusto paroquial onde se realizou também uma pequena celebração de envio (ou re-envio!) para o Quénia. Obrigado malta por tão linda recordação... Sois um espectáculo! Que o Senhor vos continue a abençoar... e... "Sempre p'l UTrilho! bem hajam!

BEM HAJAM A TODOS!

Etiquetas: , , , , , , ,